Um certo professor de matemática dizia que não dá pra comparar laranjas e bananas. A imagem é ótima. Não dá pra comparar país rico com pobre, gente que estudou a vida inteira e gente que só começou agora, roupa de festa com pijama. E a imagem tem a ver com o tanto de coisa que temos pra contar, tudo ao mesmo tempo: dicas de livros, filmes, músicas, impressões da vida, rotina de trabalho, contos, poesias e qualquer coisa incomparável ou não. Um monte de bananas e laranjas.
quinta-feira, 4 de dezembro de 2008
A nossa casa é em todo lugar
Quem é que fala com esse sotaque? Eu não puxo mais o erre, eu puxo o erre aperrtado e falo porrta quando minha vó está do lado. Ela aprovaria meu erre sem aperto? Ela reconheceria esse erre estrangeiro? Quem então fala com esse erre sem sotaque? Esse erre com sotaque capital? Foi minha irmã que disse, Eu não nego minhas origens. Quais são minhas origens? Minha vó disse, Goianas. Meu pai disse, Holandesas. Holandesas? Minha vó é mineira, meus bisavós mineiros. Mineira, eu? Eu não reconheço as ruas da minha cidade natal. Elas mudam de mão. Minha pátria é a língua. Quero falar muitas.
quarta-feira, 3 de dezembro de 2008
Não dê pérolas aos porcos
É incrível como o ser humano não muda. O que as pessoas são capazes de fazer por fama, dinheiro, prestígio, dinheiro, poder, dinheiro... já mencionei dinheiro?
É incrível como essas coisas (ou a falta delas) pode despertar a má-fé no mais bem intencionado pobre (ou rico) mortal.
Tá, vai, posso estar generalizando. Posso estar divagando sobre um lugar-comum. É só que parei para pensar nessas coisas dia desses por causa de uma pérola.
É, uma pérola. Uma pérola e um cara mexicano que eu nem conheço. Aliás, que nem existe. Só existiu na cabeça de uma cara que morreu há 40 anos. Ou não.
Explico: Ganhei um livro chamado A Pérola num sorteio literário. Ele conta uma história, baseada num conto popular mexicano, sobre um pescador que encontrou a maior pérola do mundo. Essa descoberta desperta nele e nas pessoas que moram no povoado desejos e sentimentos hostis. O pescador começa a ficar paranóico, achando que todos estão atrás de sua perolona. Talvez até estejam ou talvez seja somente delírio dele. O certo é que o texto traz à tona a inocência das pessoas que acreditam que a riqueza soluciona todos os problemas.
O autor dessa história: Jonh Steinbeck, escritor norte-americano, vencedor de um Nobel de Literatura.
Embora o livro - na verdade, é um livretinho de bolso, de mais ou menos 100 páginas - tenha sido lançado em 1947, a história não é nada desatualizada, muito menos tem a ver somente com a sociedade da época. Né?
Alguns dizem que ela evoca o socialismo, como muito da obra do autor. Mas isso é papo para outro dia. Só sei que, em muitos momentos da minha leitura, me senti angustiada, confesso. A história expõe segredos da natureza humana e conseqüencias de sair dos padrões morais e éticos.
Vale a pena ler, não demora mais que uma hora.
STEINBECK, John. A pérola. 26. ed. Rio de Janeiro: Record, 2003.
É incrível como essas coisas (ou a falta delas) pode despertar a má-fé no mais bem intencionado pobre (ou rico) mortal.
Tá, vai, posso estar generalizando. Posso estar divagando sobre um lugar-comum. É só que parei para pensar nessas coisas dia desses por causa de uma pérola.
É, uma pérola. Uma pérola e um cara mexicano que eu nem conheço. Aliás, que nem existe. Só existiu na cabeça de uma cara que morreu há 40 anos. Ou não.
Explico: Ganhei um livro chamado A Pérola num sorteio literário. Ele conta uma história, baseada num conto popular mexicano, sobre um pescador que encontrou a maior pérola do mundo. Essa descoberta desperta nele e nas pessoas que moram no povoado desejos e sentimentos hostis. O pescador começa a ficar paranóico, achando que todos estão atrás de sua perolona. Talvez até estejam ou talvez seja somente delírio dele. O certo é que o texto traz à tona a inocência das pessoas que acreditam que a riqueza soluciona todos os problemas.
O autor dessa história: Jonh Steinbeck, escritor norte-americano, vencedor de um Nobel de Literatura.
Embora o livro - na verdade, é um livretinho de bolso, de mais ou menos 100 páginas - tenha sido lançado em 1947, a história não é nada desatualizada, muito menos tem a ver somente com a sociedade da época. Né?
Alguns dizem que ela evoca o socialismo, como muito da obra do autor. Mas isso é papo para outro dia. Só sei que, em muitos momentos da minha leitura, me senti angustiada, confesso. A história expõe segredos da natureza humana e conseqüencias de sair dos padrões morais e éticos.
Vale a pena ler, não demora mais que uma hora.
STEINBECK, John. A pérola. 26. ed. Rio de Janeiro: Record, 2003.
segunda-feira, 1 de dezembro de 2008
Colheres amigas
Gosto de pensar que eu era transgressora, embora meu pai me chamasse de danada e minha mãe de desobediente. O fato é que tinha essa alergia terrível e grande parte da minha rotina e da rotina dos meus pais era tangida pelas normas que ela impunha. Tinha a hora do remédio, da vacina, do banho de permanganato, da pomada e de um tanto de coisa. Mas na minha cabeça de criança isso nunca importou muito. Eu até achava legal quando tinha que aplicar vacina na escola. Meus coleguinhas me olhavam com aquela cara estranha enquanto eu fincava a seringa na coxa na maior naturalidade. Me sentia o próprio rambo.
A coisa só ficou ruim quando o médico proibiu qualquer derivado de leite. Sem bolo, biscoito, queijo, iogurte e requeijão eu passava fácil. Mas na hora que o médico decretou a sentença terrível tudo que vinha na minha cabeça era sorvete e chocolate. E quanto mais eu pensava que não podia sorvete e chocolate mais eu tinha vontade de sorvete e chocolate. Para piorar a situação, meus irmãos mais velhos se tornaram os próprios agentes do DOI-CODI lá em casa.“Mãe, a Ana engoliu um chocolate” ou então “Tem papel de bombom na mochila dela”. Os irmãos mais velhos são sádicos por natureza, deve ter um gene que explique isso.
A coisa foi ficando insuportável porque a minha mãe avisou na escola que eu não podia comer nada de leite. Para meu desespero, o diabo do médico tinha razão. Minha pele foi ficando cada vez melhor. Quanto mais eu melhorava da alergia mais eu pensava: “Putz... agora lascou tudo. Nunca mais como chocolate”.
A salvação veio em um dia de tarde. Comprávamos pão em um mercadinho perto de casa. Lá vendia sorvete, mas todos já estavam devidamente avisados sobre a proibição terrível. Um dia fui comprar pão e notei que o esquema do sorvete era meio falho. O refrigerador ficava no fundo da loja e precisávamos chamar alguém para extrair as preciosas bolas de sorvete. Ocorre que não havia tranca nem nada. Chamávamos a moça e ela vinha com a colher e a vasilha. Pronto! Captei a mensagem do cosmos salvador.
No outro dia fui comprar pão com uma colher no bolso. Era só abrir o refrigerador e zap!!! Colher no pote, colher na boca, colher de volta no bolso! Tudo muito rápido, frações de segundo, quase uma Schumacher. Era só uma colherada porque tenho ética. Eu sabia que não podia babar na colher e colocar ela de volta no pote. Aí descobri que minha casa tinha várias colheres. Só precisava sair de mansinho porque aquele tanto de colher chacoalhava e fazia um barulho danado. A alergia persiste, hoje muito mais branda. Não me arrependo não. De que vale a infância sem sorvete?
A coisa só ficou ruim quando o médico proibiu qualquer derivado de leite. Sem bolo, biscoito, queijo, iogurte e requeijão eu passava fácil. Mas na hora que o médico decretou a sentença terrível tudo que vinha na minha cabeça era sorvete e chocolate. E quanto mais eu pensava que não podia sorvete e chocolate mais eu tinha vontade de sorvete e chocolate. Para piorar a situação, meus irmãos mais velhos se tornaram os próprios agentes do DOI-CODI lá em casa.“Mãe, a Ana engoliu um chocolate” ou então “Tem papel de bombom na mochila dela”. Os irmãos mais velhos são sádicos por natureza, deve ter um gene que explique isso.
A coisa foi ficando insuportável porque a minha mãe avisou na escola que eu não podia comer nada de leite. Para meu desespero, o diabo do médico tinha razão. Minha pele foi ficando cada vez melhor. Quanto mais eu melhorava da alergia mais eu pensava: “Putz... agora lascou tudo. Nunca mais como chocolate”.
A salvação veio em um dia de tarde. Comprávamos pão em um mercadinho perto de casa. Lá vendia sorvete, mas todos já estavam devidamente avisados sobre a proibição terrível. Um dia fui comprar pão e notei que o esquema do sorvete era meio falho. O refrigerador ficava no fundo da loja e precisávamos chamar alguém para extrair as preciosas bolas de sorvete. Ocorre que não havia tranca nem nada. Chamávamos a moça e ela vinha com a colher e a vasilha. Pronto! Captei a mensagem do cosmos salvador.
No outro dia fui comprar pão com uma colher no bolso. Era só abrir o refrigerador e zap!!! Colher no pote, colher na boca, colher de volta no bolso! Tudo muito rápido, frações de segundo, quase uma Schumacher. Era só uma colherada porque tenho ética. Eu sabia que não podia babar na colher e colocar ela de volta no pote. Aí descobri que minha casa tinha várias colheres. Só precisava sair de mansinho porque aquele tanto de colher chacoalhava e fazia um barulho danado. A alergia persiste, hoje muito mais branda. Não me arrependo não. De que vale a infância sem sorvete?
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