Eu
morro de vergonha, mas continuo a ter as perguntas absurdas. Sabe aquelas? De criança?
Quando pequena, tive inúmeras – insistentes - repetidas até enlouquecer o mais
calmo dos cidadãos. “Mãe, o que é a canjica?? E o feijão?” Quando ela explicava
que eram plantas e blá blá, eu pirava. “Planta?? Planta dá comida? Podemos
plantar o que quisermos? Bala também?” e por aí vai. Ocorre que já se passaram
anos e as perguntas absurdas insistem em acontecer. Em criança é bonitinho, mas
em uma mulher adulta é sinistro. Sinal de maluquice, no mínimo.
Então ontem eu tive uma erupção de perguntas absurdas. Cheguei da noite e olhei
para as plantas. As gatas dormiam. Era tarde. Pensei: as plantas dormem, será? Existe
um momento de latência, certo? Quando a luz já não ocorre e elas consomem
oxigênio. É o dormir delas? Elas estão mais preguiçosas, menos despertas,
propensas a babarem? Sonham? Se sonham, com o que sonham? Sonhos do
inconsciente ou vontades? Quais seriam as vontades? Muita terra, paragens
verdes a perder de vista? Não, claro que não. Esse é um sonho muito
capitalista, demasiadamente humano. As plantas devem sonhar com cheiros e cores
e olhos, muitos olhos, como os das aranhas. Serão invejosas das flores uma das
outras? Não, não. Devem saber que cada nota de verde vale mais que muitas
flores juntas e o que o silêncio onde vivem é dos mais musicais.
Pudesse, seria planta. Uma existência inteira sem jamais agredir. Ser verde e
quieta e bonita. Ter ambição de água. No máximo morrer, silenciosa e digna. Gostar
de minhoca, ter raiz e sentir a chuva. Quando morrer, faço esse pedido para
Deus ou para o encarregado que me receber. Sei a resposta, mas faço o pedido
assim mesmo. Vai que cola. O encarregado vai olhar pra minha cara e gritar lá
pra dentro: “Chefe, mais uma engraçadinha querendo pular etapas. Ô filhinha, para
ser planta é preciso ter merecimento. Primeiro, há que se ser Gandhi. Madre
Teresa também vale. Quer tentar?”.
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