A soma entre redes sociais, google e pseudo-intelectualismo resultou numa coisa, no mínimo, interessante. É que todo mundo virou poeta, sábio e filósofo – ou, pior, especialista em frases de efeito.
Por um lado é bom. Resgata-se personagens da História eventualmente esquecidos e fala-se (momentaneamente) mais bonito. Por outro lado, soa falso. Não confio em quem resolve falar de maneira rebuscada e não tem razão para isso. Nem em quem o faz sem o costume disso. Nem em caras de bigode.
Porque na vida não-virtual, não são assim (excluindo o cara de bigode, talvez). O ser humano médio atual não lembra mais de Confúcio. Talvez nem saiba quem foi Schopenhauer. Nem conhece as contribuições de Aluísio Azevedo para a literatura brasileira. Não me excluo tanto dessa conta – pode ser que saiba um pouco mais porque gosto do assunto e sou comunicadora, além de filha de um poeta, professor de língua portuguesa e amante da filosofia.
Mas, tudo bem, ninguém é obrigado a gostar ou saber de literatura ou filosofia. Há quem prefira a física quântica e ache beleza nas estruturas matemáticas em matrizes. E, ok, é seu direito postar uma frase carregada de sentimento no seu Facebook, como um velho “...que não seja imortal, posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure” – que, na minha opinião, perdeu a beleza depois de ter virado clichê – ainda que você não saiba quem é o autor, nem que isso é um soneto (muito menos o que é um soneto).
Nada mais natural do que querer compartilhar com amigos e conhecidos o que a gente gosta. Ressalte-se aí nessa frase o “gosta”. Porque existe o “parecer que gosta”, o que leva à tal enxurrada na rede de frases de efeito, vazias, descontextualizadas, que se tornam até simplórias de tão mal usadas.
Há ditos que falam por si só e exprimem a exata noção do que o autor queria transmitir. Outros só foram criados em função de acontecimentos específicos. Há ainda os que surgem exclusivamente das caraminholas dos pensadores. Porque os gigantes da literatura e da filosofia que me perdoem, mas até eles de vez em quando diziam “coisa com coisa”. Para mim, claro. Licença poética à parte e todas as licenças possíveis; sabe-se lá o que estavam pensando na hora em que escreveram.
Fato é que “Até que o sol não brilhe, acendamos uma vela na escuridão” – já que falei de Confúcio – não me quer dizer nada, a não ser o óbvio, quando publicado no Twitter de alguém que está preso em casa por causa da chuva, mora numa cidade que sofreu blecaute ou está deprê porque tomou um fora.
E Shakespeare que me perdoe, mas “Há mais mistérios entre o céu e a terra do que supõe a nossa vã filosofia” me soa como papo de bêbado em boteco do século XVII. A fala bonita parece inteligente, mas tirada de contexto não passa de meras palavras soltas. É por isso que não tem tanto sentido no seu Facebook quanto em Hamlet.
Mas a gente insiste em querer soltar as tais frases de efeito.
“O mundo é como um espelho que devolve a cada pessoa o reflexo de seus próprios pensamentos.” (essa é do Veríssimo, só para constar. Ah, sim, eu achei no google)
Um certo professor de matemática dizia que não dá pra comparar laranjas e bananas. A imagem é ótima. Não dá pra comparar país rico com pobre, gente que estudou a vida inteira e gente que só começou agora, roupa de festa com pijama. E a imagem tem a ver com o tanto de coisa que temos pra contar, tudo ao mesmo tempo: dicas de livros, filmes, músicas, impressões da vida, rotina de trabalho, contos, poesias e qualquer coisa incomparável ou não. Um monte de bananas e laranjas.